terça-feira, 29 de julho de 2014

Sobre perguntas e olhares de desaprovação, censura e decepção


E depois da formatura, qual vai ser? 
Carreira acadêmica? Nossa... professor sofre tanto, tem certeza? 

Eu sempre quis ser professora - a paixão pelo Jornalismo veio com o tempo, chegou de mansinho, instalou-se na cabeça e não pude resistir. Mas a paixão por ensinar já nasceu comigo, fator hereditário. 
Aqui em casa todo mundo é professor. E todos enchem a boca quando dizem a profissão, em voz alta. 

Dia desses, encontrei uma antiga professora do ensino médio. Conversamos e, durante o papo, tentei mostrar o brilho da profissão de jornalista, transmiti toda a minha felicidade por estar me preparando para futuramente fazer algo que acredito, contei da luta que é mudar de curso numa sociedade que, inconscientemente, impôs aos jovens um trajeto de vida pré-definido. 
O olhar, nesse ponto da conversa, era de decepção - uma aluna tão estudiosa, por que não foi fazer um curso melhor? 
Minha resposta não foi dada em voz alta. O meu olhar foi lustrado com o tempo, após tantas críticas ele brilha de orgulho e ela percebeu que não existia curso melhor, pelo menos para mim. 

A conversa caminhou até o meu futuro como profissional. 
Futuro é algo que está por vir, ainda não existe, mora alí na caixa das incertezas. Futuro é a morada das impossibilidades, dos medos. É uma "saudade que eu sinto de tudo que eu ainda não vi". Mas ela insistiu em ganhar uma resposta. 
Disse que pretendia entrar no Mestrado. Seguir carreira acadêmica. 
O olhar, nesse ponto da conversa, era de desaprovação - tantas opções de carreiras e você escolheu justo a pior? Professor sofre muito.

O meu olhar lustrado pelas críticas tornou-se opaco por um segundo. 
O professor de hoje em dia não é capaz de lembrar do poder que tem em mãos. Apesar de todos os obstáculos, das dificuldades do sistema educacional brasileiro e de toda a sujeira política jogada por debaixo do tapete da educação, não há arte mais nobre do que a de ensinar e transmitir conhecimento. 
Ensinar tornou-se negócio, há muito deixou de ser paixão. 

Professores que não olham nos olhos. Estão sempre correndo, afinal, o que importa é o número de artigos publicados, não mais o número de alunos conquistados. 
Professores que não abrem um espaço de ternura no cotidiano apressado, difícil e, eventualmente, cruel. 
E a postura do educador só piora com o subir dos degraus da escada de formação a que somos empurrados. 

Apesar do olhar de desaprovação daquela que deveria ser exemplo, lancei o meu olhar de censura e minha vontade de ensinar cresceu ainda mais. 
Não quero reproduzir teorias em sala de aula e sair de lá culpando os alunos, o governo, a universidade - quero ser apoio, educação é amparo para não nos afogarmos na primeira onda e, por isso digo, educar é grave responsabilidade. 

Falta de amor e atenção pode ser uma emergência, professores. 
Deixar aberta a porta dos diálogos não convencionais, com hora marcada no departamento, mas no fluxo habitual do interesse e do carinho. Afinal, preparar alguém como cidadão e profissional não se faz com frases prontas, mas convivendo. Se faz sendo humano, sendo terno, generoso, firme e ético. 
Sendo gente.
Afinal, professores, apesar do tempo curto que vocês tanto alegam, vocês também são gente. 

Eu poderia virar as contas e encarar aquela conversa como um desestimulo ou poderia erguer a cabeça e caminhar em busca daquilo que acredito. 
Escolhi a segunda opção. 
E para os professores que teimam em desestimular aqueles que querem seguir seus passos: relembrem o que realmente é educar e sintam orgulho de ser o que são.

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