terça-feira, 29 de julho de 2014

Ruim é deixar pra ligar no outro dia. E esquecer.


- Um combo número 3, por favor.
- Bebida?
- Guaraná. 
- Vai comer aqui ou pra viagem? 
- Comer aqui. 
- Cartão ou dinheiro.
- Cartão. 
- Pode esperar na fila ao lado. 

Diante de um diálogo assim, pude sentir o gosto de máquina, ferro, pressa e superficialidade de forma intensa. 
Não existe um ponto limítrofe entre o final da adolescência e o início da vida adulta. Não dormimos na casa dos pais e acordamos um nossa própria casa de um dia para o outro. 
A vida adulta vai chegando de mansinho, dando sinais espaçados. 

Existem inúmeros fatos que demarcam a dura fase de responsabilidades e nos obrigam a deixar de lado medos e fraquezas, para que sejam substituídos por preocupações e situações difíceis de engolir. Dentre eles, o mais doloroso, com certeza, é a dissipação das amizades ao longo do tempo.

Quando eu tinha 15 anos, minha turma era grande, podíamos nos encontrar todos os dias durante as aulas. Nessa fase, nunca pensei que amizade era algo a ser cultivado. Com 15 anos, as companhias são sempre garantidas. 
Termina o ensino médio e junto dele todas as certezas. 
Cada um trilha seu caminho, promessas de reencontros são reforçadas, você nunca pensou que existissem tantas cidades para se morar. Tantas opções. 

A universidade é algo encantador à primeira vista. O sentimento causado pela vivência de uma novidade supre o sentimento de vazio deixado pela cidade nova, pelas pessoas novas e pelas situações adversas. 
Infelizmente, toda novidade, assim como todo carnaval, tem seu fim. E, junto do fim chega um aviso, que antes fora despercebido: as companhias deixaram de ser garantidas. 

A vida adulta tem dessas, afrouxa os laços de amizade. 
Estica-os tanto que muitos deles chegam a ruir. 
Os amigos companheiros da adolescência espalharam-se por aí. A responsabilidade e os novos compromissos são marés que os carregam para os quatro cantos. 

Com o passar dos anos, as amizades tornam-se cada vez mais fluidas. Não queremos viver muito tempo num mesmo lugar, queremos mudanças que nos alimentem. 
Plantamos uma semente e não esperamos a planta enraizar. 
Alegamos falta de tempo. 
Falta tempo para ligar, tempo para conversar, tempo para abraçar, tempo para rir junto. Amizade precisa de tempo para sobreviver. 

Adultos gostam de complicar. 
Acreditam na premissa falida de que, quanto maior o sofrimento, maior o mérito póstumo. Sacrificam as amizades, mas não sabem conviver com a solidão. 
Abandonam pá e regador. Deixam o jardim secar.
Os anos vêm e ensinam que a melhor companhia que podemos ter somos nós mesmo. As adversidades nos fizeram acreditar nisso. 

A solidão não é ruim. Não é triste. Como diria Jeneci, "felicidade é só questão de ser". 
Ruim não é ficar sozinho. Ruim é assistir às amizades rumando longe nesse mar imenso de oportunidades e continuar inerte. 

Ruim é deixar pra ligar no outro dia. E esquecer.

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