Eram quase sete de
sexta-feira ao som de Jefferson Airplane, Comin' Back To Me.
Neblina circundando pontos de luz, melodia
triste e a sensação de que me falta algo. Coração desocupado e um buraco no
estômago - decido entrar num drive de um fastfood qualquer para preencher um
dos hiatos que me compõem.
Faço o pedido, refaço, é melhor pedir o dobro; comer por dois, mesmo estando só. Deixo o drive e,
apesar do pedido em dobro, é só metade que segue em frente - ainda falta algo.
Percorro o caminho de casa praguejando a solidão e
almadiçoando os semáforos vermelhos que teimam em tirar meus pés do acelerador
- frear assusta; enquanto a rapidez esconde tantos segredos nos borrões que
formam em nossas janelas, frear os expõe. Analisar segredos nunca foi meu
forte.
Num desses semáforos, entre tantos outros, milhões
de carros poderiam ter freado ao meu lado, mas aquele que marcou o asfalto era
branco. Branco por fora e cinza por dentro. Seus passageiros: um homem e uma
mulher, ambos cinzas.
Dois que não eram soma, mas subtração.
Vidros abertos, corações trancados.
Eu não consegui distinguir a melodia romântica que
vinha dali: os gritos abafaram a voz de uma banda qualquer. Nos poucos segundos
que estivemos lado a lado, nenhum sorriso ultrapassou a faixa pontilhada que
nos separava na avenida - estavam descontentes e teimavam em estar ali.
Olhei para o meu banco vazio e meu carro, apesar da
lataria preta, iluminou-se por dentro: eu estava exatamente da maneira como
gostaria e deveria estar.
Não me faltava nada. Eu estava em meu lugar, sem
teimar em driblar a solidão.
O semáforo esverdeou.
Eles se foram, descontentes. Não sabiam, ou fingiam
não saber, que nem sempre ter os dois bancos ocupados é sinônimo de estar e
sentir-se inteiro.
Dois também pode ser metade.
O semáforo esverdeou e eu sorri por dentro. Olhei o
banco ao lado e ainda restavam muitas coxinhas do Ragazzo, minhas preferidas.
Planejei minha noite de sexta - minha lista de filmes para assistir antes de
morrer ia sair da gaveta de novo.
Troquei a melodia triste.
Eram quase oito de sexta-feira ao som de The
Rolling Stones, She's A Rainbow, e minha companhia era aquela que me fazia
sentir completa, por inteiro: eu mesma.
Em tempos de greve e de frio, é você que preenche o
vazio.
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