terça-feira, 23 de agosto de 2016

Sobre nomes e fôlegos



Quem tem nome pouco comum nasce com a resiliência correndo nas veias. É preciso estar preparado para as mil e uma variações que nos acompanham pelo resto da vida. Moldar-se a cada letra adicionada, trocada ou subtraída.
Meu avô paterno é Osvaldo na certidão de nascimento, mas todos o chamam de Chicão. Certa vez, quando tinha pouca idade e muita imaginação, perguntaram-me o nome dos meus avós e, de prontidão, respondi Vânia e Chicão. O erro rendeu risos e uma reflexão tardia sobre quão profundamente mergulhamos nas águas do outro.
Assinaturas de e-mail são termômetros preciosos de atenção. Repetimos o ritual corporativo diariamente.Escreve-se uma mensagem formal e, atenciosamente, assinamos próximo ao rodapé. O nome vem todo rebuscado. Cores, endereços, logotipos e telefones. Percebo, aliás, que o nome dos cargos, aqueles que insistem em se posicionar logo abaixo do nosso, como rótulos, estão cada vez maiores. 
Analista de comunicação digital e mídias sociais. Ufa! Dá até para perder o fôlego. Cresceram tanto que nos esmagaram. Como gigantes, colocaram-nos sob suas sombras. 
Deixamos de ser a Luísa, Ana, Camila, o Bruno ou Marcos. Somos analistas, coordenadores, auxiliares, CEO, CFO, CIO e uma porrada de outras siglas sem carne, osso ou alma. 
Personagens tipos de um enredo em que pouco importa nossas particularidades. Seguimos circundados por rótulos que deixam rastros de cola e resquícios de papel quando tentamos arrancá-los com as unhas, em mais um daqueles surtos de identidade.

Conta-se nos dedos aqueles que mantêm presa a respiração até, finalmente, topar com seu nome, no abissal de um mar agitado de informações.
Tamiris não é nome tão incomum, mas, confesso, cheio de possibilidades. Ele está na assinatura de todos os e-mails que envio e no alto das redes sociais. Fico enjoada de vê-lo tão espalhado por aí. Ainda assim, recebo mensagens e respostas com Thamiris, Tamires, Thamires, Thamyris. 
Quando as leio, resgato toda a resiliência existente em minha corrente sanguínea para ser a variação daquele dia, bem como um punhado de paciência para compreender quanto fôlego o outro destina a mim.

Gosto quando, de repente ou por acaso, acertam meu nome de primeira. Sinal de que nadaram até o fim. Bateram pernas, aumentaram a concentração de dióxido de carbono nos alvéolos e, já arroxeados, conheceram-me verdadeiramente. 
Colocaram a letra "i" no lugar certo, seguindo a lógica fonética que meu pai, letrista, usou para me registrar quando nasci.

Naqueles tempos em que dissociava o Chicão do Osvaldo, não compreendia a importância que o ritmo de nossa respiração exerce na vida das pessoas que nos rodeiam. 
Depois de tanto engolir o sal da água, tentando valorizar e economizar a resiliência do outro, me dei conta de que a atenção está nos mínimos detalhes e na quantidade de letras que acertamos quando nomeamos aqueles com os quais dialogamos. 
Fôlego, hoje em dia, é coisa valiosa. Os cilindros de oxigênio nos deixaram mal acostumados.

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