Hoje
à tarde, quando saía do trabalho, deparei-me com um casal almoçando em uma mesa
sob o sol. Parei ao lado do carro e comecei a busca pelas chaves dentro da
bolsa. Enquanto percorria todas as repartições daquela que continha uma boa
parte dos meus dias, não pude deixar de ouvir o diálogo entre os dois – que
mais parecia um monólogo, visto que ela, cabisbaixa, não tinha direito de
resposta.
O
momento foi breve, mas o suficiente para que a frase no imperativo chegasse aos
meus ouvidos.
A
ordem reverberou nas paredes que
circundavam minhas memórias.
Eu
já estive na posição de destinatária daquela mensagem – e também não ergui os
olhos. Os meus, lembrei, pareciam bacias cheias d'água que não transbordavam
por um fio – daquelas que carregamos na cabeça e, se feitos movimentos bruscos,
derramam. Deixei-os baixos por medo da correnteza do rio. Medo de ser levada
para longe pelo fluxo salgado de lágrimas que escorreria de dois poços
castanhos.
Coloque-se
no seu lugar.
Eu não soltei as mãos, empurraram-me sem desvios em direção
aquele lugar que era meu.
Fui forçada a começar a caminhada.
Empurrão faz tropeçar no começo e, em meio a tropeços e
passos vacilantes, eu fui. Afastei-me e
cheguei a um lugar em que habitavam
medos só meus, amores só meus – sentimeus.
Demorei a acostumar. Afastar todos os véus e penetrar na
selva do autoconhecimento que cobria o caminho subsequente de interrogações.
Varri a folhagem seca para o canto – monte de folhas
amarelas, cor de outono, que encobriam a passagem de acesso à clareira central,
na qual morava a paz de estar em par comigo mesma.
Cheguei ao meu lugar e não pretendo mais voltar.
Quem quiser que traga flores ao me visitar.
Tive vontade de puxar
uma cadeira e me juntar a eles – pedir um suco tão frio quanto aquilo que
pensavam estar vivendo, e dizer a ela: cumpra, pela última e derradeira vez, a
ordem que recebe.
Coloque-se no seu lugar que, posso garantir, não é ao lado
de quem enche seus olhos de lágrimas.
Entendi, definitivamente, que amor não manda para longe – é
dois que partem na mesma direção, buscando clareira em comum.
Quis puxá-la pelas mãos, tirá-la dali e mostrar os tantos
lugares que poderiam ser dela.
Entrei no carro e dei uma última olhada praquela mesa e, em mim, alojou-se uma esperança – que ela
seja um dia empurrada contra o precipício também.
Que ele a liberte para que ela ocupe, de fato, seu lugar.
E, por fim, quando aqueles dois tornaram-se apenas pontinhos
distantes em meu retrovisor, desejei com muita intensidade que ela, um dia,
quisesse estar ao lado de alguém que não invadisse seu espaço, mas que
estivesse disposto a visita-la em seu universo – sem impedir suas estrelas de
brilharem.
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