terça-feira, 22 de setembro de 2015

Um brinquedo, repetições e a vida como ela é




O fim e o começo nunca andam só. Estão sempre de mãos dadas, caminhando tranquilamente rumo à eternidade. Eles precisam um do outro para existir. Sem o fim, não há começo. E, se o começo não se torna real, o fim, consequentemente, não poderá, mais tarde, entrar em cena. 
Feito a bailarina de Andersen que, com suas sapatilhas vermelhas, nunca parava de dançar, fugimos incansavelmente de um possível e temporário estado letárgico dos acontecimentos da vida. Mal chega o fim, logo queremos um novo começo - não há espaço para ser inerte. Todos calçamos as sapatilhas vermelhas de Andersen. 




Enquanto esperava minha senha apitar no guichê do banco, decidi assistir à brincadeira repetitiva de uma criança da fileira da frente. O menino, tão pequeno, conseguia, sem saber, uma demonstração prática do que é essa longa caminhada que costumamos a chamar de vida. Em suas mãos, um cano de metal e uma bola do mesmo material. A brincadeira era, em partes, simples: colocar a bola em uma das aberturas e fazer com que todos os obstáculos fossem vencidos, até fazê-la sair pela abertura oposta. Nas primeiras vezes, o menino sentiu dificuldade em conduzir a bola por todo o seu percurso. De tanto repetir o movimento, entendeu qual era o jeito correto e menos penoso - começava e terminava sem a fadiga do início. 
Acompanhei seus movimentos até perder a conta de suas comemorações e novas tentativas. O apito da senha no guichê me fez despertar. Fui atendida e, ao sair, o menino ainda estava lá. Repetindo os começos em busca de finais vitoriosos - mimetizando, primorosamente, o nosso acostumar. 
Diante de tantos começos e finais, a gente se acostuma a jogar o jogo da existência. Acho que, dessa forma, somos capazes de nos acostumar até com a perspectiva esmagadora da morte. 

A gente só não se acostuma com o tempo necessário para que ocorra o encontro de um final e um novo começo. Não permitimos que o fim e o começo apaixonem-se um pelo outro no seu próprio tempo - criando laços que os fortaleçam. O fim mal tem tempo de flertar com novos começos e logo lhe impomos aquele que, pela nossa perspectiva, parece ser o melhor. 
E, assim, como a bola de metal que me hipnotizou durante a espera no banco, começamos e terminamos incessantemente, na espera de que o próximo fim encontre o começo perfeito para que, finalmente e demoradamente, ocorra o dar de mãos eterno, dentro da luz, como se fosse o dia de todos os pássaros de Sionésio e Maria Exita.

Hoje chegou mais um fim e, com todo o coração, fiz-lhe uma promessa: o próximo começo não será posto em sua frente a fim de causar-lhe mais um tropeço; será escolha sua e virá de mãos estendidas para uma caminhada tranquila rumo à abertura do lado oposto do cano de metal.

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