domingo, 9 de novembro de 2014

Dança de fogo e água

Somos copo meio cheio, meio vazio.
Possuímos no fundo da alma o nada e o abundante em equilíbrio. 

Quando copo meio vazio, externalizamos todo o nada guardado no baú de sentimentos  - estresse, raiva, impaciência e grosseria. Somos metade, meio vazios. 
A outra metade, no fundo do recipiente, contém líquido manso como o brilho das estrelas em noites tranquilas. 

Quando copo meio cheio, transbordamos o abundante. Os melhores tesouros que carregamos vibram, querem fugir do dentro que os bloqueiam, atingir o outro que os provocaram.

As pessoas têm o poder de despertar o nada ou o tudo em nós. 

Há muitos céus no íntimo de cada um, um céu para cada encontro da travessia. Porque o céu é local de reencontro com coisas que amamos e o tempo nos roubou -  no céu está guardado tudo aquilo que a memória um dia amou. 
O meu céu pode ser meio cheio, meio vazio; estar cheio de nada, ou vazio de tanto transbordar.
Pode ser um céu de fogo que, dizia Neruda, é a substância dos poetas.
Pode ser um céu de incêndio, que destrói poesias. 

Fogo enfeitiça os olhos com suas chamas. 
Há uma linha tênue entre a labareda mansa e a combustão descontrolada. As chamas começam a dançar frente aos olhos, os objetos vão perdendo os contorno e, ao final, tudo é fumaça. 
Se a faísca no céu dançará lentamente ou perderá o controle, depende da intensidade do sopro parido dos lábios do outro. 

As pessoas têm o poder de acender o fogo de sentimentos aconchegantes e de incendiar o céu, parte delas dentro de nós. Têm o poder de remar rumo à terceira margem do rio, que é a saudade de Riobaldo; e também o poder de seguir o fluxo das águas sem deixar o gosto da volta.

O fogo e a água que completa a metade do copo dançam conforme a música que exala a alma do outro - se harmoniosa, calmaria haverá; se desafinada, só o tumulto. 



Nenhum comentário:

Postar um comentário