Fitava a janela com olhos de outra
época. Não fazia tanto tempo desde a última vez em que seus olhos encontraram
aquele olhar castanho, mas o tempo é mesmo coisa relativa – parecia que uma
vida toda havia se passado até então.
Os pensamentos diluíam como tinta
num balde d’água – mistura de cores que dançam como véus no infinito
translúcido. O vermelho de um sorriso
daquele dia que ela usava um vestido da mesma cor entrelaçava-se com o verde
das mãos dele numa tarde de Janeiro sem prazo para acabar.
Todos os momentos foram
traduzidos em cores que se desmancharam - uniram-se num clarão branco que cegou
seus olhos. Como névoa que impede o passageiro de continuar, o branco preso em
sua retina a impediu de avançar com as lembranças.
As cores desapareceram. O branco,
união de todas elas, dispersou-se como o dar de mãos entre a sua e as daquele
que protagonizavam as cenas de histórias que naufragavam num mar de outras tantas
dentro de sua cabeça. Cansou de existir.
Apagou-se a luz. Escuridão.
Ausência de todas as cores – o
preto tomou conta do cenário.
É no escuro que, por ironia,
conseguimos enxergar como, após um tempo, qualquer fio sutil que une duas
pessoas estica conforme a distância até o dia de dividir-se em dois
mundos. O fio, muitas vezes inflexível,
faz um enorme esforço para se manter inteiro, mas a força, decomposta em lados
opostos, ganha a batalha.
No final são pontas soltas, como
serpentes buscando um novo começo – um novo ciclo, para se enrolar novamente e
dar continuidade ao barbante que tece a vida.
Relacionamentos são palhetas
prontas para receber as tintas coloridas que servirão a dois pincéis – pintura
à duas mãos. No começo, somos capazes de pintar o arco-íris; cores separadas
por tons. Sabemos exatamente distinguir nossos sentimentos, tanto quanto
notamos a diferença entre amarelo e azul.
Com o tempo, os pincéis lutam
para se pintar por inteiro - o vermelho das brigas, laranja do pôr-do-sol
daquele dia de despedidas, azul dos céus das viagens. A palheta perde delimitações
de cores e sentimentos e, na bagunça do dia-a-dia, as cores unem-se no branco que
cega.
O término também é poesia – é rascunho
que não teve acabamento. Palheta de cores que sujou com a fuligem das cores
fortes.
É fio que se parte e, com pontas
gastas, recompõe-se; como mãos que cicatrizam, não importa qual o tamanho da
ferida.
As mãos logo arrumam outras mãos para lhes curar o machucado, o fio entrelaça com outros fios de pontas gastas.
As mãos logo arrumam outras mãos para lhes curar o machucado, o fio entrelaça com outros fios de pontas gastas.
Fim é questão de ponto de vista.
Olhando daqui até parece um começo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário